A Gravidade de um Pássaro
A partir de histórias reais de migração de Anouar Ben Janaf, Candy Toma Paulus, Caroline Bergeron, Jaime Mears, Jeff Childs, João David Batista, Laura Afonso, Manuela Tavares, Pacas, Sohel Rahman e Sunil Pariyar.
A GRAVIDADE DE UM PÁSSARO é um projeto sobre o enraizamento, o corpo migrante e a nossa necessidade de auto-construção permanente. Como é que nos ligamos à terra? O que acontece quando partimos?
Urge a necessidade de colocar estas questões e ouvir a experiência de corpos-outros, outras formas de sentir a necessidade de partir, o ser estrangeiro e as possibilidades de encontrar ligação num novo espaço. O projeto cria, a partir de conversas e sessões de trabalho com pessoas em situação de migração, esta ficção feita de testemunhos de vários outros, que serão usados como voz cénica. A experiência de deslocação do corpo e do lugar tornam-se matérias poéticas fortes, que permitem desenvolver o binómio “enraizar-se e migrar/mover-se”, porque tocam a pergunta subjacente ao fazer do corpo: como se habita o espaço? E tocam ainda uma ideia fundamental que é a do encontro com o outro. O que é este outro? E se há um corpo que exprime na sua raiz um outro lugar, de que forma essa experiência do corpo é transformadora do próprio lugar?
Através de uma pesquisa sobre histórias reais de migração, criamos uma peça onde se indaga o aspeto paradoxal do corpo na vida e as formas como habitamos o corpo e o mundo. Apela-se a um tratamento do corpo como veículo de ligação ao outro e de auto-reinvenção permanente. Em criação, usamos o jogo acrobático e a qualidade samurai das nossas metodologias como ferramentas de leitura e reinvenção destes materiais. Algumas referências fortes, como a peça Can We Talk About This, dos DV8 Phisical Theatre, as instalações da artista plástica Shiota Chiharu, o texto Da Hospitalidade do filósofo Jacques Derrida e a poesia de A. Ramos Rosa em A Construção do Corpo, são bússolas importantes para a criação.
Dois corpos interagem num espaço de jogo-desafio, num ato que vai beber tanto ao coro, à noção de ritual, ao transe da dança e da canção; como se deixa atravessar pelo dissonante, introduz o silêncio inesperado, a paragem impossível, a desconstrução da forma e a validação da crítica e da desobediência. A missão destes atos, deste grande ritual discrepante, é apontar para a necessidade de autoconstrução de um corpo, de encontro e ligação a novos outros.